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segunda-feira, 9 de julho de 2007

O POLVO (2ª Parte)



Continuação
”(...) Reginaldo Teles era um ás a esgrimir os punhos, sabia avaliar com grande exactidão a capacidade dos seus adversários, e quando não os podia vencer trazia-os para junto de si. Um anjo, este rapaz que veio bastante jovem de uma aldeia transmontana para servir numa tasca de um tio. O estabelecimento estava aberto toda a noite, numa altura em que ainda existiam poucas discotecas. E as que funcionavam em pleno estavam viradas para o alterno e a prostituição. Mas Reginaldo Teles sabia que «putas e vinho verde» só combinam nas horas e nos locais certos. Havia que tratar da vidinha. Ajudava o seu tio pela madrugada dentro e vivia com entusiasmo as cenas de pancadaria entre azeiteiros, putas e marginais. O seu sonho era um dia vir a ser como eles. Homens valentes, com charme, e mulheres tratadas a pontapé a levarem-lhes o apuro da noite e o que até tinham roubado ao prazer. Sobre as delícias do amor, Reginaldo propagandeava dotes extraordinários, como fruto da leitura de um livrinho que comprara na Feira de Vandoma, uma obra cujo título tinha algo a ver com cama(obviamente) e que ensinava a combinar o beijo inclinado com o beijo pressionado. Essa era a matéria que Reginaldo dominava perfeitamente, como já se disse, com destaque para a arte de beijar.
Mas ainda estava longe de ser o rei na noite, sendo por norma acordado por mais um pedido da Bety ou da Lady, pois as putas por aqueles lados tinham todas nomes ingleses...- Ó miúdo, serve-me aí uma sande de fígado com molho e cebola e um copo desse verde rasca que o teu tio tem aí! Reginaldo Teles não se deixava comover. Afinal, eram putas. Tinham de ser tratadas assim. Enrugando a face, com os cantos da boca a quebrarem para baixo, fazia inchar o peito, punha-se em bicos de pés na tentativa de imitar os chulos e atirava com o prato da sande e o copo para a frente da mulher enquanto pensava: «Ainda vais trabalhar para mim». Foi então que um indivíduo com cara de rato, esquelético e de cabelo oleoso, se foi encostando à prostituta que Reginaldo servia e, com uma habilidade nata, meteu os garfos na carteira e roubou-lhe o porta-moedas. Reginaldo, que estava por detrás do balcão a retirar da montra de vidro um naco de polvo envolto em cebola, viu a cena e não perdeu a sua oportunidade de brilhar. Saiu do balcão e, com determinação, agarrou o carteirista e evitou que a Aljazira, mais conhecida por Lady, ficasse sem os poucos tostões que o seu chulo lhe deixou. Apercebendo-se de toda a cena, a Aljazira levantou a mão e deu um soco no carteirista enquanto lhe dizia: -Ah, meu filho da puta de choringa! Sem tempo para pensar, Reginaldo Teles nem sequer hesitou quando se apercebeu que o carteirista ia responder à agressão. Formando um salto, deu uma cabeçada seguida de uma esquerda no choringa e este esparramou-se no chão sem vontade de se levantar. Quando o pôde fazer, nem sequer olhou para trás, deitando a fugir pela rua abaixo. Os presentes fartaram-se de gabar Reginaldo, não só pela sua coragem como também por aquela esquerda indomável. A Aljazira esqueceu-se de que tinha sido vítima de roubo e começou a medir o miúdo de alto a baixo com um sorriso comprometedor e, olhando por cima do ombro, disse-lhe quase num sussurro: -Hoje tens direito a uma de graça! -Com direito a beijo pressionado?- quis logo saber Reginaldo. Que sim, disse ela. Reginaldo Teles não cabia em si. Puxou do pente que trazia no bolso de trás das calças, passou-o pelos cabelos e não deixou ninguém perceber que ainda era virgem. Pegou no resto do vinho que sobrou no copo da Aljazira e emborcou-o de uma golada enquanto lhe dizia: -Estou-te com uma sede! Quando fechou a tasca, lá estava a Lady à sua espera para uma madrugada de amor. Mas estava, ainda, Reginaldo com a chave metida na porta, e já o chulo da Aljazira lhe tocava no ombro. -Onde pensas que vais meu filho. O estabelecimento já fechou. Se queres desenferrujar o prego, espera para amanhã e não te esqueças de trazer trocado. Reginaldo Teles ficou fora de si. Já estava a pensar com os tomates, e aquele gajo não lhe podia vir estragar a festa. Olhou de alto a baixo o chulo. Fixou-o bem nos olhos e achou que lhe podia dar uma tareia. A sua célebre esquerda saltou como um gancho e abateu-se nos queixos do chulo. Ainda este não se tinha recomposto e já levava um meia dúzia de socos, caindo KO no passeio. Numa só noite, Reginaldo tinha abatido dois adversários. Aljazira não hesitou. Estava cheia daquele chulo, e Reginaldo seria o seu novo amante. Meteu-lhe o braço e, com firmeza, levou-o até ao seu quarto alugado, por trás da Igreja da Trindade. Por coincidência ou não, os sinos tocaram a assinalar as cinco da matina e uma gata berrou de cio. Reginaldo estava eufórico e, depois de ter descascado em dois duros da noite, não podia de forma alguma deixar perceber que aquela era a sua primeira noite de amor. As suas calças de bombazina preta começaram a ser afagadas por Aljazira enquanto ela se despia. Ao ver o seu par de mamas, Reginaldo não se aguentou mais e teve uma ejaculação. Lady sentiu as calças humedecidas. -Já te vieste? Reginaldo, sem mostrar atrapalhação por aquele percalço, ensaiou uma vez mais a pose de durão.
-Isto é só uma amostra. Vê se te preparas depressa. E em que pressinha se foi a virgindade de Reginaldo Teles. Aljazira ficou encantada com toda aquela fogosidade e, mostrando-se submissa, pediu com um certo carinho: -A partir de hoje vais ser o meu chulo? Reginaldo sorriu, enquanto puxava as calças para a cintura e apertava o cinto. -Depois da sova que dei ao teu chulo, achas que ele teria coragem de aparecer? O teu homem a partir de hoje, claro que sou eu. Mas para que essa conquista ganhasse forma, havia muitas lutas para vencer. Os pretendentes faziam fila porque o negócio estava mau e havia de aparecer um valentão a conquistar os seus direitos da mesma forma que o fez Reginaldo. Aljazira gostava do miúdo, era forte e atrevido, mas para ficar com ele tinha de pensar numa forma de o proteger. Reginaldo tinha punhos, mas faltava-lhe a experiência. De súbito, veio a solução. Ela tinha um cliente que era treinador de boxe do maior clube da cidade (do Porto) e ia-lhe apresentar Reginaldo Teles para o rapaz poder ir lá fazer uns treinos. Uma semana depois, o tal treinador de boxe disse a Aljazira que Reginaldo tinha futuro. A partir daí, quando as coisas aqueciam no «Ginginha», a tasca do seu tio, Reginaldo Teles fazia uns treinos extra, passando a ser conhecido e respeitado. Depois de fechar a tasca, aproveitava a boleia de um amigo e ia ter com a Aljazira, que atacava em Santos Pousada. Trazia o apuro e a rapariga. Os dois estavam apaixonados. O beijo pressionado passava à história. Reginaldo começou a somar êxitos no boxe e acabou por deixar o emprego na tasca do seu tio para se colocar como segurança e porteiro numa casa de alternos. Foi aí que conheceu a Lisa. Mas um dia, Aljazira descobriu tudo, entrou pela boite dentro, localizou a Lisa, que bebia uma garrafa de champanhe com um cliente enquanto este a beijava no pescoço, pegou-lhe pelos cabelos, atirou-a por cima da mesa e armou por ali uma algazarra tremenda. Reginaldo Teles tentou acalmar as coisas. Não podia perder o emprego e lá convenceu Aljazira a ir-se embora, não sem antes esta prometer que matava a Lisa se ela continuasse atrás do homem dela. Reginaldo Teles tinha-se tornado num dos chulos mais importantes da cidade e, com a ajuda da Lisa, acabou por comprar o seu próprio estabelecimento. O rapaz tinha jeito para o negócio, e a Lisa tinha uma perspicácia tremenda para escolher as melhores putas. Ambicioso, inteligente, hipócrita e já com algum poder económico, Reginaldo Teles tinha apenas mais um sonho: ser campeão nacional de boxe. Ele era bom de punhos, mas havia outros melhores. Com algum sacrifício e habilidade, conseguiu chegar à fase que lhe permitiu disputar o título. O seu adversário era poderoso e Reginaldo Teles não se podia arriscar a deixar fugir o seu sonho. Sempre inclinado para negócios marginais, colocou logo em prática um plano diabólico. Ele sabia que no boxe profissional a corrupção por parte de grupos marginais era uma prática constante e quase normalizada, e num ápice resolveu o seu problema. Contactou o seu adversário, negociou a vitória no terceiro "round" e um KO mal disfarçado deu-lhe a oportunidade de saltar no ringue elevando as luvas em sinal de vitória. Era importante para o seu negócio que os jornais noticiassem no dia seguinte que ele era o novo campeão nacional de boxe. Aquele título significava respeito e medo. Os factores mais importantes para quem quer gerir com tranquilidade uma casa de alternos e de prostituição. Este fora o seu primeiro acto no mundo da corrupção, e Reginaldo Teles ficou fascinado com o poder do dinheiro. Afinal, ele tinha feito um investimento altamente rentável. Pagou para conquistar o título, realizou o seu sonho e duplicou a facturação no seu estabelecimento. Ninguém se arriscava a criar conflitos na sua área de alternos e muito menos a deixar contas penduradas. Os punhos de um campeão eram sempre temidos.
Aproximavam-se novas eleições e Galo da Costa ia ganhando terreno. O treinador Austríaco (Hermann Stessl) que fora convidado para tomar conta do seu clube sob a gerência de Américas de Sá não estava a dar conta do recado. Os sócios habituaram-se aos títulos e queriam mais, mas a bola teimava em não entrar na baliza. Enquanto isso, GC esfregava as mãos e preparava a sua candidatura. Os apoios eram cada vez mais fortes, e uma nova estratégia foi colocada em movimento. Ele tinha de apostar forte na vitória eleitoral e, aproveitando os maus resultados da equipa, organizou por todas as freguesias da cidade sessões de esclarecimento com uma programação meticulosa. Iniciava-se, assim, a «Operação Ácido Sulfúrico», cuja alternativa, em caso de falhanço, tinha o nome de código de «Operação Cicuta». Na organização dos seus comícios, GC deu sempre preferência aos bairros pobres e à parte velha da cidade. Era aí que estava o povo e a força do clube. GC organizou o seu staff comandando um grupo de associados aos quais impôs serem eles a obrigarem-no a partir para uma candidatura. Desenvolveu-se então o célebre grupo dos 500, do qual saíram elementos devidamente comandados que se distribuíam pelos cantos das salas onde eram organizadas as tais sessões de esclarecimento. A missão deles era empolgar as sessões e fazer perguntas previamente combinadas com Galo da Costa. Numa dessas noites, na Associação Recreativa de Miragaia, foi assim: -Presidente, qual é o principal inimigo do clube? -Antes de mais, repito, ainda não presidente...Gargalhada geral, e GC tomou as rédeas à sala, não evitando porém a queda de estuque sobre o novo casaco, -O principal inimigo está dentro do clube, o servilismo a Lisboa. Estamos fartos de ser espoliados. Chegou a hora de dizer «basta». Com uma cajadada, GC matava dois coelhos. Para além do mais, o discurso saía-lhe cada vez mais com mais facilidade e tudo era acompanhado, comentado e analisado pela imprensa desportiva e jornais diários. A cidade e Américas de Sá viviam sob o fogo cerrado de Galo da Costa. O presidente já não podia sair à rua sozinho, e as assembleias gerais eram cada vez mais escaldantes, levando mesmo o doutor Américas de Sá ao desespero e a chorar em público. Foi nessa altura que Reginaldo Teles teve o seu papel mais importante. Organizou um grupo de guarda-costas recrutados nos quadros da secção deboxe do clube que, com alguns rufias nocturnos à mistura, organizou alguns ataques a jornalistas que de uma forma ou outra denunciavam a protecção a Galo da Costa. Evidenciando alguma inteligência e revelando o seu carácter de hipócrita, Reginaldo Teles verificou que a derrota de Américas de Sá era mais que evidente, e assim se foi distanciando da protecção que prometera ao seu presidente. Algumas figuras notáveis da cidade aliaram-se a Galo da Costa e, no momento das eleições, a derrota foi fatal para Américas de Sá (...)”.
Continua...
Nota: Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.

9 comentários:

1234567vv disse...

Devias ter chamado a isto "O Puolbo, CARAGO"!

Continua, está muito bem!!! ;-)

el niño rosso disse...

Isto em livro vai dar direito a um prémio qualquer. É certo!

Anti PORKOS CORRUPTOS!!!! disse...

Muito bom....

Quase tão bom como o grande concurso da Blogosfera Portuguesa:

http://quemquerserporcob.blogspot.com/

Não percam.

Anónimo disse...

Continua. Sou novo demais para saber a história toda e agora estou curioso

arrebumbas disse...

Essa do "O Puolbo, CARAGO" foi muito bem metida Vermelhovzky, bem jogado! Eheheheh!

arrebumbas disse...

el niño rosso, não percas os próximos capítulos. A partir do 4º é que isto vai começar a aquecer, acredita.

arrebumbas disse...

Oh amigo reinaldo pasteles, se reparares bem, já estás linkado aqui no blog.
Apresenta lá esse trabalho sobre os ANDRADES e o estádio do "Cornão".
Força nisso!

arrebumbas disse...

Amigo anónimo das 11:17 PM, como já escrevi anteriormente, a partir da 4ª Parte é que isto vai ser o bom e o bonito, acredita-me...

MAD*MAX disse...

Arrebumbas,
Os post's d'polvo estão magnificos!
Aproveito a oportunidade pra te dizer ke já roubei o nº2 tambem, foi postado no www.benfica-forum.com
Aparece por lá e diz d'tua justiça,junta a tua à nossa força...
O convite é alargado a todos os visitantes d'Amo-te Benfica

Saudações desportivas
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